25 de março, de 2012 | 00:00
Propaganda atrai a pessoa para a bebida”
Pessoas em recuperação e especialista afirmam que divulgação na mídia é um incentivo
IPATINGA Carros, paisagens litorâneas e mulheres são alguns dos itens que, geralmente, compõem uma propaganda de cerveja. O uso da publicidade para divulgação de marcas de bebidas é, para as pessoas que estão em recuperação e especialistas, um incentivo ao vício. A discussão sobre a proibição de tais mídias é antiga e, em 2011, chegou a ser sugerida pelo deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).
Paulo B., 53 anos, em processo de recuperação há 14 anos, afirma que o alcoolismo não tem cura, mas pode ser controlado ao longo da vida com idas ao Alcoólicos Anônimos e força de vontade. Sobre a influência da publicidade, Paulo explica que o apelo publicitário chama a atenção das pessoas no início do vício. As pessoas associam a bebida à alegria, êxito, aventura. No começo, quando está entrando no vício, você acaba sendo seduzido pela propaganda, que atua de forma negativa, atraindo para a bebida”, opina.
Para J.G., 58 anos, até mesmo a forma de chamar atenção para o cuidado” com a vida das pessoas é uma forma de incentivo. Eles falam pra você não dirigir depois de beber. O certo seria não beber, mas até nesse ponto a propaganda é persuasiva”, resume.
A psicóloga e psicanalista Maria Cristina Abrantes tem se dedicado à discussão e estudo referente ao álcool e droga. Segundo ela, a propaganda deveria ser questão de política pública, seguindo o mesmo caminho adotado em relação ao cigarro.
No caso do cigarro, Maria Cristina observa que a campanha feita no país não foi de prevenção, mas sim um trabalho de limitação. Podemos perceber que começou limitando as propagandas, os anúncios e, por fim, retirando o cigarro da televisão”, pontua. A psicóloga lembra que o uso de imagens de pessoas doentes e também o aumento do preço contribuíram para inibir o consumo. Entretanto, a especialista afirma que a questão não é simplesmente proibir, mas fiscalizar e limitar os meios de comunicação e propagação da substância.
Em relação ao álcool, Maria Cristina explica que o Brasil ainda não bancou isso. A cachaça mineira, por exemplo, é tida como algo rico da cultura. A cerveja é algo amplamente divulgado. A propaganda tem efeito atrativo sim”, opina. Para a psicóloga, a solução passa pela coerção e proibição da propaganda. Hoje as pessoas estão muito preocupadas com o crack e esquecem que o grande problema e que causa danos há anos é o alcoolismo”, pondera.
Incentivo
Em setembro de 2011, o presidente da Comissão de Estudos sobre Políticas Públicas de Combate às Drogas, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), afirmou defender a ideia do fim da propaganda de bebida alcoólica na TV. A declaração foi feita durante o Seminário Nacional de Políticas Públicas de Combate às Drogas.
À época, o deputado lembrou que houve grande avanço quando foi retirada da TV a propaganda de cigarro. Em menos de 8 anos, nós tiramos mais de 30 milhões de brasileiros do tabaco. O País tinha 32% de fumantes, hoje são 17%. O álcool causa um prejuízo enorme ao Brasil, por isso temos que diminuir o incentivo ao consumo de álcool”, disse Lopes.
O moderador do Portal e-democracia, Bruno Porto, ressaltou que a propaganda para incentivar o uso de uma droga como o álcool é totalmente errada. Hoje, a gente vê a propaganda de bebida alcoólica em competição de futebol. Existe a hipocrisia de que o álcool é uma droga leve, mas é, na verdade, extremamente perigosa”, declarou.
Cigarro
As propagandas para a venda de cigarro ficaram mundialmente conhecidas por sua beleza e demais atrativos que chamavam a atenção para o produto. Cenários grandiosos e lindas paisagens serviam de pano de fundo para divulgar as marcas, até meados dos anos 90.
Uma resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que fixa limites de alcatrão, nicotina e monóxido de carbono nos cigarros comercializados no Brasil, de fabricação nacional ou importados vigora no país. O texto também restringe o uso de aditivos em todos os produtos manufaturados derivados do tabaco.
De acordo com a resolução, é considerado aditivo qualquer substância ou composto que não seja tabaco ou água, utilizado no processamento das folhas de tabaco e do tabaco reconstituído, na fabricação e no acondicionamento do produto derivado do tabaco, incluindo açúcares, adoçantes, edulcorantes e aromatizantes, entre outros.
A proibição gerou reclamações e, no dia 16 de março último, a empresa produtora de tabaco Philip Morris distribuiu comunicado à imprensa em que lamenta a regulamentação sobre produtos de tabaco anunciada pela Diretoria Colegiada da Anvisa. A empresa diz que examinará todas as alternativas para combater a medida e pede uma revisão imediata da Resolução.
Segundo a empresa, a decisão "terá um impacto devastador sobre a produção e cultivo do fumo". "A Anvisa optou por desconsiderar as preocupações reiterada e consistentemente levantadas por produtores de fumo, fornecedores, varejistas e fabricantes durante todo o processo de consulta pública. Suas ações são arbitrárias, extremas e não apresentam qualquer evidência relevante de que terão um impacto positivo para a saúde pública", diz a nota da companhia.
Maria Cristina alerta que cada pessoa tem uma história e uma forma de satisfação e não necessariamente se satisfaz só com coisas boas. Segundo a psicóloga, alguns bebem por felicidade, outros para conquistar” uma mulher. Porém, dizer que de fato existe algo que vai te levar à isso é complicado. Para um sujeito que já está num circuito da droga qualquer coisa estimula. Não é só a propaganda que é a grande vilã. Entretanto, somente quando o país abrir mão desse tipo de veiculação é que vai conseguir progresso na questão do vício”, conclui Maria Cristina Abrantes.
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