03 de setembro, de 2009 | 00:00

O “Xerife” se aposenta da PC

O delegado Francisco Pereira Lemos anunciou oficialmente nesta quarta-feira (02) a sua aposentadoria da Polícia Civil

Arquivo/DA


Lemos se despede do ofício de policial civil e vai ser político em tempo integral
FABRICIANO - “Doutor Lemos” agora só na política. O delegado Francisco Pereira Lemos anunciou oficialmente nesta quarta-feira (02) a sua aposentadoria da Polícia Civil. Foram quase trinta anos de serviços, marcados pelo enfrentamento ao crime na região do Vale do Aço. “Fui detetive por 13 anos e atuei outros 15 como delegado, e entendo que nós realizamos bem o nosso trabalho”, analisou.Delegado titular de Timóteo e plantonista da 19ª Delegacia Seccional, Lemos ainda exerce o mandato de vereador pelo PDT em Coronel Fabriciano. Ele recebeu o DIÁRIO DO AÇO em sua casa, onde, numa entrevista concedida de forma descontraída, lembrou os bons e maus momentos na profissão policial. “Hoje, a nossa polícia tem muita retórica e pouca ação”.Casado e pai de duas adolescentes, Francisco Lemos é de uma família de seis irmãos, três homens e três mulheres. Antes de ser policial civil o delegado serviu na Marinha Brasileira, onde chegou ao posto de cabo. “Minha formação foi lapidada na Marinha. Viajei muito e aprendi que o homem tem que ter vergonha, ter honra”, comentou.Leia os principais trechos da entrevista:DIÁRIO DO AÇO: De que o senhor vai se recordar da polícia?LEMOS: Dos muitos serviços prestados, principalmente à comunidade do Vale do Aço, onde eu trabalhei a maior parte do meu tempo. Foram muitos crimes desvendados e criminosos presos. A polícia, para mim, foi um sacerdócio. Eu fazia o trabalho de polícia como prazer. E quando você trabalha com prazer, nem vê o tempo passar. Como fazer este trabalho?A primeira coisa é ter a confiança do povo. Ninguém consegue fazer polícia se não tiver a confiabilidade das pessoas de bem. Graças a Deus, consegui esta confiança. As pessoas não passam uma informação para um policial se não sentirem essa confiança. Quero pedir aos colegas que se aproximem da população. O que é mais difícil, ser detetive ou delegado?Gostei mais de ser detetive, mas nunca tive dificuldade em trabalhar. Sempre fiz esta crítica à cúpula da Polícia Civil, pois o interior (do Estado) é o que menos recebe recursos. Em Timóteo, para fazer um bom trabalho, sempre contei com o apoio do município e de empresários. Ser policial antigamente, como era?Quando cheguei aqui, em Fabriciano, só tinha eu como detetive e trabalhava com a “triagem”. Eram policiais militares, um sargento, dois cabos e três soldados. Aprendi muito com eles. Não existe a figura do delegado Lemos sem uma equipe, um grupo de pessoas que nos ajudou a prestar um bom serviço à comunidade.Antes era diferente assim?Antes da Constituição de 1988, a gente tinha mais liberdade de ação. Eu não tinha mulher, filhos, e praticamente era policial 24 horas por dia. Peguei um período aqui (no Vale do Aço) de pistolagem, quando morriam 30 a 40 pessoas por mês. Para combater, tinha que partir para cima com troca de tiros.Quais eram os policiais que trabalharam nesta época?O sargento Amador, soldado Souza e Silva, os detetives Vander, Cléber, Gilmaro e Paulinho Carcereiro foram os que trabalharam comigo. Alguns iam para o Espírito Santo num dia e depois iam parar no Mato Grosso. Poucas pessoas sabem disso, mas não é fácil prender um bandido que está no crime há muito tempo. Era questão de honra prender o criminoso. Hoje, a maioria dos policiais virou burocrata. Qual o maior erro da polícia?É a omissão. Quando a gente é omisso, alguém paga um preço muito alto. O bandido faz levantamento do local onde vai agir e analisa se pode dar certo ou não. Se tem um grupo de policiais comprometido, ele não vai agir. Aqui tinha uma quadrilha que planejava atacar até dois bancos num mesmo dia. Conseguimos prendê-la no Espírito Santo, São Paulo e até no Rio. Hoje é mais difícil acontecerem na nossa região assaltos desse tipo.E delegado, juiz, quem o ajudou neste trabalho?Eu falaria do delegado Lhamas (José Geraldo, também aposentado), que tem inteligência, é um homem que tem ‘feeling’. É uma pessoa que tinha um conhecimento humano grande. Tem também o coronel Teatini (Sandro Afonso Teatini), que trouxe muita contribuição ao Vale do Aço. Precisamos do apoio de todos, como da juíza Maria Aparecida Grossi, José Augusto, promotores Luiz Antônio Prudente, Castelar Modesto Guimarães.Bandido bom ainda é bandido morto?Eu sempre acreditei no ser humano, mas no dia a dia encontramos pessoas que não têm respeito pelo ser humano. Para essas pessoas, eu falo que o bandido bom é bandido morto. Tem alguns no Vale do Aço para os quais a frase cabe bem. Isso vale para todo traficante, pequeno ou grande. Se eu pudesse, mataria todo traficante.E hoje, político ou policial? Vai ser candidato a prefeito?Eu aprendi a ser policial, mas nunca planejei ser político. Agora, estou sendo cobrado quando me aposentei. Quando você conversa com algum político e ele fica dando desculpas, é mau político. Sobre ser candidato a prefeito, está longe ainda. Até lá as coisas mudam. Como foi a convivência com a imprensa?Quero agradecer à imprensa do Vale do Aço, que sempre me apoiou nas nossas ações. A gente não acerta sempre. Um exemplo é a polícia do Rio de Janeiro. Lá, a imprensa só foca nos erros da polícia, que não tem condições de trabalhar. Quero até agradecer ao DIÁRIO DO AÇO, que sempre valorizou os trabalhos da polícia e que, quando fala dos erros, fala de uma maneira sensata, sem enfocar somente nos erros.Casos de repercussão marcaram a carreiraA carreira do delegado Francisco Pereira Lemos ficou marcada pela apuração de crimes de repercussão no Vale do Aço. Entre eles, a prisão de José Calixto Costa, em Eunápolis/BA, o mentor do sequestro de uma integrante da família dos Bretas, em Santa Maria de Itabira, ocorrido no início da década de 1990. Além dele, toda a quadrilha foi desbaratada. O delegado também participou na apuração de uma chacina familiar ocorrida no bairro Cidade Nobre.O desfecho do assassinato da modelo Leila Bramusse, em Coronel Fabriciano, é outro que chocou a população. O primo dela foi identificado como o autor do homicídio. “Ninguém podia pensar que seria uma pessoa próxima a ela. Até o advogado Jayme Rezende, que é padrinho de minha filha, ficou com raiva de mim”, lembrou.Outro caso que chamou a atenção da comunidade foi a prisão de Cláudio Jorge Toledo, o “Psicopata”, na cidade de Santa Juliana, no Triângulo Mineiro. Toledo cometeu latrocínio (matar para roubar) contra o empresário José Celso Lucas, de Timóteo. “Eu gosto de ser desafiado. Ele disse para a noiva num telefonema: ‘O Lemos é muito homem, mas eu quero vê-lo me prender’. Era questão de honra, e fizemos a prisão dele”, disse.Lemos apontou um caso que ele não conseguiu elucidar, nem a identidade da vítima, nem a autoria. É o “Crime da Mala”, em que uma mulher foi esquartejada e posta dentro de uma mala, jogada no rio Piracicaba. Sobre bandidos mortos em confronto, o delegado apontou: “Eu nunca saí de casa com a intenção de matar alguém. Já enfrentamos muitas pessoas que não tinham amor ao próximo, nem respeito pela polícia. Todas as pessoas que partiram para o enfrentamento pagaram um preço muito alto.”O delegado Lemos recomendou que o caminho para se fazer um bom trabalho policial é estar ao lado do povo. “Eu quero mostrar que sou doutor para o bandido, ali tem que me chamar de doutor, tem que me respeitar. Logo cedo compreendi que deveria estar ao lado do povo e não distante do povo. O povo do Vale do Aço acredita, e muito, na polícia”, finalizou o agora aposentado Francisco Lemos.
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Comentários

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Paulo R. Oliveira

05 de novembro, 2018 | 10:35

“Grande a minha alegria ao ver esta matéria sobre Lemos. No período de 71 a 83 foi quando o conheci, creio que certamente não se lembra de mim, não éramos íntimos mas sempre admirei o trabalho dele quando era simplesmente um policial iniciando em Cel. Fabriciano.
Estive muitos anos no exterior e somente a 10 estou de volta no Brasil
Toda trajetória deste valente foi aí em nossa região até chegar onde está. Que Deus o abençoe pois é de homem assim que o Brasil de Hoje precisa.
Se um dia se candidatar ao qualquer pleito federal estarei com ele, pois moro hoje em outro estado.

Paulo Oliveira”

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