14 de setembro, de 2008 | 00:00

Alterações na Língua Portuguesa

Novo Acordo Ortográfico mudará apenas 0,5% do vocabulário brasileiro

Wôlmer Ezequiel


Glória Vitorino afirma que as mudanças atingirão 2% da Língua
IPATINGA – As mudanças previstas no novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que entrará em vigor no Brasil a partir de 2009, geram muitas dúvidas e discussões, especialmente nos meios acadêmicos. O acordo foi avaliado em 1986 e votado em 1990, para vigorar na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Fazem parte desse bloco: Angola, Moçambique, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Brasil, Portugal e Timor Leste, totalizando cerca de 240 milhões de pessoas. O assunto foi um dos pontos discutidos no I Simpósio Mundial de Estudos de Língua Portuguesa – I Simelp, realizado de 1º a 5 de setembro, em São Paulo. A colunista do DIÁRIO DO AÇO, professora de Língua Portuguesa no Unileste-MG e doutoranda em Estudos Lingüísticos pela PUC/Minas, Glória Dias Soares Vitorino, participou do evento e procurou se inteirar sobre o acordo e suas implicações.   O Simpósio foi organizado pela Universidade de São Paulo (USP), em parceria com as Universidades Cruzeiro do Sul (UNICSUL/SP) e a de Évora (Portugal). O evento recebeu representantes de todos os países cuja língua oficial ou uma das oficiais é o Português. Educadores da Finlândia, Macau e China, onde a Língua Portuguesa é ministrada em universidades como disciplinas optativas, também marcaram presença. O público presente no Simpósio foi de cerca de 1.200 pessoas, conforme informou Glória. A professora explicou que o acordo é um documento que propõe a vigência legal de novas regras em relação à grafia de algumas palavras. As alterações somam cerca de 2% do vocabulário total do idioma. “A proposta principal do acordo é tentar resolver o que se considera inadequação de algumas palavras. Pensa-se também em aperfeiçoar o sistema ortográfico do Português, de modo a promover certa ‘unificação’ da grafia, mas não da Língua Portuguesa. Na prática, não vai diminuir o número de regras e continuam ocorrendo muitas exceções”, detalhou. De acordo com Glória Vitorino, as alterações propostas atingem o alfabeto, o emprego de maiúsculas e minúsculas, a acentuação gráfica, emprego do hífen, trema, consoantes mudas pronunciadas ou não e grafia de derivados. Prós e contras Portugal é o país que mais sentirá os impactos das alterações. Do percentual de 2% de mudanças previstas no acordo, 1,6% atingirá o vocabulário de Portugal. No Brasil, o percentual é de apenas 0,5 do total de palavras. Diante disso, naturalmente, Portugal é o país que está mais resistente às mudanças. Conforme explicou Glória, a corrente que é contrária ao acordo alega que haverá uma irreversível descaracterização do idioma, especialmente no caso da supressão de consoantes mudas. Antes do acordo, em Portugal, se escrevia actual, óptimo, selecção. Após o acordo ficará assim: atual, ótimo, seleção. “Essa é uma mudança que pode provocar um aumento no número de homônimos, segundo estudiosos do assunto. Nesse caso, Portugal rende-se ao Brasil, que já registra tais palavras dessa forma. E é exatamente esse um dos motivos do grande descontentamento de Portugal em relação às alterações. Segundo o especialista em Ortografia Maurício Silva, os críticos lusitanos do acordo acreditam que ‘Portugal estaria em franca desvantagem no que diz respeito à maneira como os vocábulos deveriam ser grafados, já que, a seu ver, a maior parte das alterações constitui uma violência imposta aos conhecimentos e sensibilidade dos portugueses que aprenderam a ortografia anterior’”. Glória disse ainda que os portugueses reclamam da falta de um debate mais amplo e democrático sobre a questão. Por outro lado, os defensores do Acordo Ortográfico argumentam que a novidade tornará a comunidade lusófona mais forte, com o fortalecimento econômico-comercial em vista da possível criação de blocos, como o Mercosul e a Alca. “Nesse caso, acredita-se que uma unificação ortográfica poderia facilitar o intercâmbio cultural, pedagógico e administrativo”, pontuou Glória Vitorino.  Impacto no mercado editorialObviamente, o novo Acordo Ortográfico causará impactos no mercado editorial. Glória Vitorino informou que esse setor foi representado no Simpósio pela Editora Ática, uma das maiores fornecedoras de livros didáticos no Brasil. “As Editoras já deverão fornecer livros atualizados, em 2009, para as crianças que iniciarão o processo de alfabetização, pois elas já aprenderão a escrever a partir das novas regras. Nos anos seguintes, os demais estudantes do ensino fundamental e médio. Então, elas deverão reimprimir obras que estejam desatualizadas, nesses prazos”, disse.A professora informou que as mudanças deverão atingir cerca de 320 milhões de livros, somente no mercado editorial brasileiro. “Segundo Márcia Takeuchi, representante da Ática no Simpósio, para que se consiga adequar os manuais didáticos às novas regras, o aumento de custos já chega a 25%, e vem alterando significativamente a rotina do setor”, finalizou Glória Dias Soares Vitorino.  Mudança gradativaNas salas de aula e pátios das escolas, professores e estudantes aguardam com expectativa a aplicação das alterações. Mas não há grandes motivos para preocupações, já que a mudança será feita gradativamente. Os estudantes do fundamental devem receber os livros atualizados em 2010 e os do ensino médio em 2011. “As novas regras só serão cobradas nos vestibulares a partir de 2012. Convém lembrar que, nos vestibulares mais conceituados, que se pautam pelos mais recentes estudos lingüísticos, não se cobram regras de ortografia propriamente, mas sim um uso atualizado das normas nos textos produzidos. Sobre o acordo, acredito, assim como a maioria dos lingüistas brasileiros, que esse documento propõe apenas uma mudança de grafia, e não da língua, mesmo porque não se quer nem se pode modificar a língua, que tem seu curso próprio, a despeito de toda a tentativa de unificação”, opinou Glória.A doutoranda acredita que as mudanças não trarão transtornos para os professores. “Eles estão acostumados a desafios muito maiores, num país em que priorizar a educação é algo que se dá apenas no nível dos discursos. Quem assume essa profissão, assim como qualquer outra, sabe que uma de suas funções é a de se atualizar sempre. Afinal, estamos na era informação, da velocidade, da transdisciplinaridade”, declarou. Polliane Torres
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