23 de abril, de 2008 | 00:00

À mercê da própria sorte

Desempregada, cearense “mora” em barraco de caixotes no Centro

Wôlmer Ezequiel


Há 10 meses, a calçada da rua Juiz de Fora, em Ipatinga, é a morada de Ana Cláudia
IPATINGA - Há cerca de 10 meses, a desempregada Ana Cláudia Torquato de Souza mora na calçada da rua Juiz de Fora, no Centro, a poucos metros da Praça dos Três Poderes. Nas proximidades do ponto de ônibus de linhas urbanas, ela montou seu barraco com caixotes de madeirite recolhidas de um supermercado. Nascida há 31 anos em Fortaleza (CE), Ana Cláudia conta uma história que se assemelha à de muitos sem-teto do Brasil. Em busca de condições melhores, mudou-se de sua terra natal para São Paulo. Em seguida, saiu da capital paulista em direção a Belo Horizonte e, por fim, chegou a Ipatinga. Durante os anos do périplo pelas metrópoles, engravidou cinco vezes. As crianças, segundo ela, vivem atualmente com os respectivos pais nas três cidades. “Optei por vir a Ipatinga porque o pai de dois dos meus filhos mudou-se para cá. Então, vim com o objetivo de ficar mais próxima, mas até hoje não consegui localizar onde eles se encontram”, contou à reportagem do DIÁRIO DO AÇO, na semana passada.No barraco onde vive, a cearense se vira como pode. Para se alimentar, conta com a ajuda do companheiro com o qual divide a morada e de residentes do Centro. Para tomar banho e fazer as necessidades fisiológicas, utiliza as instalações do supermercado localizado em frente ao barraco.Desapego Apesar das condições precárias em que vive, Ana Cláudia demonstra um desapego material e não culpa ninguém pelas circunstâncias que a fizeram morar na rua. Sua principal queixa é em relação aos homens com os quais já se relacionou. No dia em que o DA conversou com a desempregada, ela disse que estava “despachando” o companheiro com quem dividia o barraco, justificando que o homem a tratava mal.
Wôlmer Ezequiel


A cearense Ana Cláudia (detalhe) montou sua “casa” na rua Juiz de Fora
“Acho que as coisas não deram certo para mim por causa dos homens que passaram pela minha vida. Nenhum deles contribuiu para que eu me estabilizasse ou para que eu tivesse as condições mínimas para tentar trabalhar”, comentou Ana Cláudia, confirmando que assistentes sociais já tentaram tirá-la da rua Juiz de Fora e alojá-la no Albergue Municipal. No entanto, as regras do estabelecimento, que proíbem o uso de cigarro e bebidas alcoólicas, dificultaram a sua adaptação ao ambiente. “Eu bebo uns goles para esquecer dos problemas, embora saiba que essa não seja a solução para enfrentar as dificuldades da vida. Lá no albergue, não agüentei as regras e as proibições, então voltei para o barraco”, explicou.Na rua, ela conta que passa por intempéries diversas, desde a repressão policial até a ação de vândalos, que já chegaram a atear fogo no seu barraco. Ela acredita que sua condição irá mudar a partir do momento em que reaver sua documentação.Limite Conforme a assistente social do Albergue Municipal, Fernanda Machado Lopes, a situação de Ana Cláudia já foi encaminhada ao Centro de Atendimento ao Cidadão (CAC). “Estamos tentando obter a segunda via da certidão de nascimento dela para que ela possa tirar os demais documentos”, informou a assistente.Fernanda Lopes disse que a atuação dos assistentes sociais vai até certo limite, e um desses parâmetros é aceitar a decisão do morador de rua sobre o local onde pretende ficar. “No caso de Ana Cláudia, tentamos propor um acordo em que a Administração Municipal ficaria responsável por pagar o aluguel em uma residência no Centro. A ajuda seria de R$ 100 e ela chegou a escolher uma casa. O primeiro pagamento foi feito, mas ela e seu companheiro não saíram do barraco. Neste caso, não podemos continuar ajudando, pois eles agiram errado”, afirmou.Conforme a assistente social, atualmente é incomum deparar, em Ipatinga, com moradores de rua nas mesmas condições de Ana Cláudia. No seu entendimento, as pessoas que montam barracos para ficar na rua geralmente se recusam a viver no Albergue Municipal e costumam vir de outras cidades. “Os que aceitam ajuda ficam no albergue, onde recebem alimentação, acomodação e até mesmo ajuda para retornarem às suas cidades de origem. Quando esse tipo de assistência é rejeitada, não podemos ir além, pois assim estaríamos cerceando o direito de ir e vir das pessoas”, finalizou Fernanda Lopes.
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