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23 de agosto, de 2016 | 14:22

O soldado e a tatuagem

Jorge Ferreira S. Filho

Concurso público para policial militar na Polícia Militar do Estado de São Paulo. O candidato ao cargo de soldado vencera as etapas iniciais e chegou à fase do exame médico. Nesse ato, o examinador detectou uma tatuagem na perna direita do examinado e o desclassificou para o preenchimento de vagas de soldado de 2ª classe.
O fundamento para a rejeição do candidato centrou-se na alegação de que a tatuagem estaria “em desacordo com as normas do edital”. O futuro soldado, sentindo-se ferido em seu direito líquido e certo, interpõe mandado de segurança e sai vitorioso no julgamento em primeiro grau. A Polícia Militar apela e o Tribunal de Justiça Paulista reforma a sentença para excluir o candidato do concurso. Inconformado, o prejudicado recorre ao Supremo Tribunal Federal.
O caso foi julgado no RE nº 898.450, em 17 de agosto de 2016. A maioria dos ministros deu ganho de causa ao candidato. O raciocínio elaborado pelos ministros exala respeito e tolerância à liberdade das pessoas.

A tatuagem é um significante (signo, uma marca figurativa ou nominativa) que tem o poder de comunicar vários significados. Identifica o tatuado como integrantes de: grupos criminosos (máfia siciliana, russa, japonesa etc.); clubes de motociclistas; paraquedistas; admiradores de pássaros; alpinistas; religiosos e tantos outros). Às vezes é o nome da pessoa amada ou a imagem dessa que se finca definitivamente na pele do corpo.

Em outros casos, é o desenho de uma singela flor, que se destaca nas costas, pernas ou pés de uma mulher. É a tatuagem amálgama de muitas linguagens: da sedução; do chamar a atenção; da mensagem da leveza; das posturas de sexualidade e muito mais. Um ato de liberdade. Exteriorizações da pluralidade. Merece o respeito e a proteção do Estado, devendo ser censurado apenas quando comunica uma mensagem contrária ao Estado Democrático, como tatuar uma suástica ou a cruz flamejante da ku-klux-klan.

A maioria dos ministros caminhou para o entendimento no sentido de que: "Editais de concurso público não podem estabelecer restrições a pessoas com tatuagens, salvo situações excepcionais, em razão de conteúdo que viole valores constitucionais.". Mas não é só, pois o ministro Luiz Fux foi além, dizendo que: "A máxima de que cada um é ser feliz a sua maneira deve ser preservada e incentivada em grau máximo pelo Estado.

Estudando os pormenores do processo, constata-se que, diante do caso em tela, os ministros do STF apresentaram-se mais à vanguarda, ao passo que os desembargadores paulistas revelaram-se mais conservadores, legalistas e positivistas.

Pode-se, também, concluir que a leitura que fazem os ministros do nosso texto constitucional pode divergir muito da interpretação das centenas de desembargadores do nosso país. Isso incentiva os litigantes a tudo fazer, quase um contorcionismo, para que o processo chegue à Brasília; ponto final do bonde Esperança. Status garantidor da morosidade da justiça brasileira.

Jorge Ferreira S. Filho. Advogado - Articulista. E-mail [email protected]
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