10 de agosto, de 2016 | 16:40

O dia seguinte

Zenólia M. de Almeida

O magnífico espetáculo apresentado na abertura dos Jogos Olímpicos Rio-2016 foi inesquecível para nada menos que cinco bilhões de espectadores que buscavam entender que país é este. A euforia com que os brasileiros reagiram à lúdica, porém formal cerimônia, não foi menor. Como entender a reação alegre, descontraída da plateia, quando o desencanto com o País e com suas lideranças políticas é latente?

No cadinho racial chamado Brasil, múltiplas são as identidades dos atores que reagem a diferentes estímulos com a mesma intensidade: amor e ódio; alegria e tristeza; encanto e desencanto; mel e fel. Emoções contraditórias talvez expliquem o fato de que, atolado na mais grave crise econômica, política, ética e moral de todos os tempos, o brasileiro ainda consegue se desconectar da realidade, em uma alegria despretensiosa e comemorar o momento como se fosse o ideal.

Tudo começou em 2009, quando a cidade do Rio de Janeiro foi confirmada como sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Na oportunidade, a decisão foi festejada: "Os Jogos Olímpicos no Rio serão inesquecíveis, pois estarão cheios da magia e da paixão do povo brasileiro", discursou o presidente Lula, encantado com a conquista que julgava ser sua.

O momento pelo qual passava a economia brasileira era extremamente positivo. O governo acreditava que a descoberta do pré-sal (2007) transformaria o Brasil num dos maiores produtores e exportadores de petróleo e derivados do mundo. Por volta de 2016 (período das Olimpíadas) essas reservas seriam exploradas em larga escala garantindo o sucesso do evento. Tudo parecia fácil: os custos previstos seriam cobertos pelas três esferas de governo, pelas parcerias público-privadas, pelo Comitê Olímpico Brasileiro e patrocinadores. Como legado, ocorreria o planejamento urbano e social de longo prazo, o crescimento do interesse pelo País e o desenvolvimento do esporte.

Com o tempo a crise chegou e aconteceram mudanças. Desvios, furtos, orçamentos superfaturados, e outras maracutaias deixaram o “rei nu”. Muitos escândalos evidenciaram a participação de políticos e empresários no famoso “jeitinho brasileiro de levar vantagem em tudo” — exemplo típico de malandragem institucionalizada que contaminou todos os níveis da administração pública no governo do PT e mataram nossos sonhos e expectativas.

Com a Olimpíada Rio-2016, o governo teve a oportunidade de universalizar a boa prática esportiva, cujo exercício prepara para a vida: ensina a respeitar o outro, a trabalhar em grupo, a lutar com honra e dignidade, deixando um legado maior para as novas gerações. Não basta fazer da abertura um espetáculo, esconder as mazelas, banir a violência e prevenir as tragédias presentes no cotidiano do carioca, criando um clima de alegria e confraternização, se, quando acabar, eis de volta o mundo real.

O fato de ser conhecido como o País do carnaval, futebol, lindas praias, belas mulheres e, bandidos... Forma estereotipada justificando declarações infelizes como a que fez o ator Robin Williams no programa David Letterman Show, após a escolha da cidade do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016: "Chicago mandou Oprah e Michelle Obama e o Rio mandou 50 strippers e meio quilo de pó”...

Somos um povo que vive intensamente o presente, mas tem dificuldades em aprender com os erros do passado. Quando se apagarem as luzes do grande show das olimpíadas, é preciso que o legado seja maior do que as construções e as mudanças físicas que marcaram sua presença no Rio de Janeiro. Mais importante é saber: que lições aprendemos?

Zenólia M. de Almeida. Socióloga, com PhD em Gestão. Membro da Academia valadarense de Letras.
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