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06 de novembro, de 2020 | 13:42

Estupro culposo? Entenda o que de fato ocorreu no julgamento do caso Mariana Ferrer

Vanessa Perpétuo Simonassi *

"Essa multiplicação de hashtags ligada ao julgamento em questão não procede"

Recentemente ganhou força nas redes sociais e veículos de informação em geral a expressão: Estupro culposo, decorrente do caso Mariana Ferrer. Afirmações de que, uma decisão judicial havia absolvido um acusado, transformado estupro de vulnerável em estupro culposo.

Mas o que consiste Estupro de vulnerável? O que é estupro culposo? Essa “transformação jurídica” de fato ocorreu? Primeiramente cabe ressaltar que, não vamos adentrar no mérito da decisão. Discorremos apenas quanto a análise da alastrada expressão estupro culposo e acerca do real fundamento da absolvição.

O crime de estupro de vulnerável é previsto no Art. 217-A do Código Penal. A vulnerabilidade é atribuída àqueles que não possuem aptidão psicológica ou física, faltando-lhe a capacidade de entendimento para consentir a relação sexual ou à praticar do ato libidinoso. No teor da Lei, é considerado vulnerável: Vítima menor de 14 anos. Vítima que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato. Vítima que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. Aqui entrou a alegação da acusação, de que Marina no dia dos fatos havia sido topada e não podia oferecer resistência ou tinha consciência para consentir com a relação sexual.

Praticar relação sexual com qualquer pessoa nessas condições caracteriza o crime de estupro de vulnerável, com pena de reclusão de 8 a 15 anos. Sendo irrelevante a intenção do agente. E a figura do estupro culposo, existe? Não. É possível absolver um acusado em crime de estupro, por não ter a intenção de estuprar configurando assim a modalidade culposa do crime de estupro? Também não.

E porquê? Porque não há previsão legal. Explicando: O Art. 18, parágrafo único Código Penal prevê o princípio da excepcionalidade da modalidade culposa, ou seja, só haverá crime culposo quando o fato for expressamente previsto na lei na modalidade culposa.

O Código Penal prevê expressamente as penas cominadas a todos os delitos que possuem modalidade culposa, se não há previsão no CP de determinado crime na forma culposa, é porque este não é legalmente admitido à título de culpa, ou pune-se a título de dolo (o acusado quis praticar o crime) ou a conduta é atípica (o fato não tem previsão legal, não é crime).

O crime de estupro só é admitido na modalidade dolosa, não há previsão de modalidade culposa desse crime, não existe “estuprar sem ter a intenção de estuprar”. Estupro é crime, e caracterizado e provado o estupro, incide as penas previstas no Código penal.

Sobre o caso Mariana Ferrer: Da análise da sentença absolutória em primeira instancia do caso Mariana Ferrer, verifica-se que, nenhum momento consta a expressão ou qualquer referência a absolvição por estupro culposo.
Na sentença o fundamento da absolvição foi art. 386 VII do Código Processo Penal, que prevê a possibilidade de absolvição quando não há nos autos provas para uma condenação criminal.

Acertada ou não, a questão que nos reportamos aqui é: não houve a criação do “estupro culposo” tampouco a transformação de estupro de vulnerável para a modalidade culposa como vem sendo propagado.

Em nenhum momento consta da sentença a expressão ou qualquer referência a absolvição do acusado por estupro culposo. Essa multiplicação de hashtags ligada ao julgamento em questão não procede. Não há qualquer fundamento ou ligação com o real motivo da absolvição no caso retratado. A absolvição foi por insuficiência probatória. Essa decisão é passível de recurso. Estupro culposo não existe. E nem existiu no caso em questão.

* Advogada. Especialista em Direito de Família e Criminal. Membro da Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim). Pós-graduada em Ciências Criminais pela PUC. Formação em Psicanálise e Criminologia pela UFMG. Pós-graduada em Filosofia e Teoria do Direito PUC. Coautora do Livro Estudos contemporâneos em Ciências Criminais. Pós-graduada em Direito Civil pela PUC. Especialista em Direito das Famílias e Direito Sucessório pelo IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família. Membro da Comissão de Assuntos legislativos do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. Mestrado em Responsabilidade Civil pela PUCMG (d.i).
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Comentários

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Paulo

08 de novembro, 2020 | 16:10

“Dai o grande perigo de votarmos em deputados de extrema direita. A mudanças de algumas leis progressistas alcançadas com muita luta podem regredir. Na cabeça dessa gente não existe a figura do mais fraco, mas o pensamento que o mais forte sempre deve dominar. Dai o pensamento liberal prevê que temos muito direito e quer colocar a todos em pé de igualdade. Então pra quer, estatuto disso ou daqui. Adeus rede proteção.”

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